2007-04-11

"As formigas", Boris Vian (II e III)

II

Depois entrámos pela costa adentro e experimentámos pôr em prática os conselhos dos instrutores e as coisas aprendidas nas manobras. O jipe do Mike chegou nessa mesma altura. Quem vinha a guiar era o Fred, e o Mike estava partido ao meio; tinham-no encontrado metido com um arame-farpado. Andamos a proteger com chapa de aço a dianteira das outras carripanas, porque está quente demais para se andar de pára-brisas levantado. Isto aqui ainda chia por todos os lados e fazemos patrulha atrás de patrulha. Parece que avançámos mais depressa do que devíamos, e é difícil manter contacto com o reabastecimento. Esta manhã lixaram-nos nove tanques, pelo menos, e aconteceu uma estranha história: um foguetão arrastou uma bazuca e o tipo foi agarrado àquilo, preso atrás pela bandoleira. Ainda se deixou levantar quarenta metros antes de descer de pára-quedas. Julgo que vamos ser obrigados a pedir reforços, porque ainda agora ouvi uma coisa parecida com o ruído de uma grande tesoura de podar, julgo que nos cortaram a retaguarda…

III

… Faz-me lembrar há seis meses, quando acabavam de cortar-nos a retaguarda. Devemos estar completamente cercados, e o Verão já acabou. Por sorte ainda há comida e munições. Temos de fazer rendições de duas em duas horas, e é cansativo estar de sentinela. Os outros tiram as fardas aos nossos, quando fazem prisioneiros, dá-lhes para se vestirem como nós e temos que desconfiar. Com tudo isto deixou de haver luz eléctrica e apanhamos com granadas que vêm de todos os lados ao mesmo tempo. Para já, tentamos restabelecer contacto com a retaguarda; têm de mandar-nos aviões, pois os cigarros começam a faltar. Lá fora há barulho, qualquer coisa andará na forja, a gente nem temos tempo de tirar o capacete.

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