2007-10-04

«Circo», José Saramago

Poeta não é gente, é bicho raro
Que de jaula ou gaiola se escapou
E anda pelo mundo às cabriolas,
Aprendidas no circo que inventou.
Estende no chão a capa que o disfarça,
Faz do peito tambor, e rufa, salta,
É urso bailarino, mono sábio,
Ave de bico torto e pernalta.
Ao fim toca a charanga do poema,
Todo feito de notas arranhadas,
E porque bicho é, bicho ali fica,
A uivar às estrelas desprezadas.

«Despedida na ausência», Ana Margarida Falcão (excerto)

Um riso a completar na tua inexistência
na ausência de quem não pode partir.
Um riso a completar na transgressão da incerteza
na despedida inventada por inventar
amanhã
ou hoje
devagar
em silêncio.

in Poemas, Ilha 4, Ed. CMF, 1994